Quinzenalmente o Secretário-geral da UCCLA, Vitor Ramalho, escreve um artigo de opinião para o “Novo Jornal” de Angola. No seu último artigo presta uma homenagem justa e merecida ao seu irmão, Marcos Levi Ramalho, e a Angola, a sua terra.
Por Angola - Uma Homenagem
Não há futuro sem memória e é útil lembrá-lo, invocando também pessoas com vidas que tiveram sentido por terem marcado com realizações de referência na passagem terrena.
Vem isto a propósito do meu amigo Leiria Pinto, engenheiro e consultor em Angola, o ter-me invocado, várias vezes e de forma acalorada, o recente projeto do “corredor do desenvolvimento do Lobito”.
É que a terra onde nasci, a Caála, está associada ao Caminho de Ferro de Benguela, marcando-me para a vida.
Evoco-a hoje, sobretudo por uma justa homenagem devida por Angola ao meu irmão, Marcos Levi Ramalho, engenheiro civil, carinhosamente tratado por Marvi, nascido no Luena e infelizmente já falecido.
Em 1929, o governo do regime colonial em Angola resolveu dar à minha terra, a Caála, um outro nome, Robert Williams, que naturalmente não vingou.
A Caála foi e será sempre a Caála, onde viveram muitos anos o general França N’dalu, o empresário António Mosquito, o músico Raul Indipwo, que todos aí conheci e onde nasceu a economista Judite Correia, o ex-Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, Vítor de Sá Machado, a economista e minha familiar Madalena Ramalho, o médico Dinis da Gama, o cineasta Fonseca e Costa e sua irmã Cucha Carvalheiro, atriz e encenadora, e tantos outros que vezes sem conta tenho presente.
Seja como for, Robert Williams foi o engenheiro inglês que retomou a construção do Caminho de ferro de Benguela, que o ligaria à República Democrática do Congo.
A concessão do Caminho de Ferro de Benguela foi dada em 1902 e atingiu a fronteira leste de Angola, no rio Luau, em 1928.
Em 1972, com o curso de engenharia tirado no Instituto Superior Técnico, em Portugal, o meu irmão assumiu, como engenheiro da empresa “Construções Técnicas, S.A.”, a responsabilidade de dirigir a execução das pontes do CFB que integraram a chamada “Variante do Cubal”.
Tinha então 27 anos, tendo sido aluno na cadeira de Pontes do Professor Engenheiro Edgar Cardoso, uma referência mundial na engenharia, que lhe atribuiu a mais elevada nota possível.
Para se ter a noção do que representam as pontes da “Variante do Cubal”, em obras de arte da engenharia, delas consta uma das dezassete da “Variante do Cubal”, entre outras três da capa do livro editado pela Ordem dos Engenheiros portugueses, que tem por título “100 obras de engenharia portuguesa no mundo no século XX”.
Hoje, que tanto se fala no “corredor do desenvolvimento do Lobito”, concessionado ao consórcio LAR, de que a “Mota Engil” faz parte, não posso deixar de recordar também esta empresa onde mais tarde ele viria a trabalhar e onde igualmente exerci funções como jurista.
Coincidências da vida, sendo que o meu irmão teria ainda a direção de outra obra, a do alargamento do porto do Lobito, concluída já na transição para a independência de Angola, onde o visitei, ainda nas “Construções Técnicas”.
E porque África esteve sempre presente na sua alma, coube-lhe outra feliz coincidência, a de dirigir, ainda na empresa Construções Técnicas”, a então maior fábrica de cimentos de África, em Oujda, Marrocos, na fronteira com a Argélia.
Bem-haja, por isso, ao meu amigo Leiria Pinto, por me recordar, ao invocar amiúde e com entusiasmo, o atual projeto do “corredor do desenvolvimento do Lobito”.
Devia ao meu irmão esta homenagem, sempre num quadro de referência também a Angola, usando e abusando, neste caso, de uma representação que não tenho do país que o viu nascer, como se a homenagem fosse atribuída merecidamente por este país, Angola, sendo, porém, minha.
O governo de Angola não levará a mal.
É por Angola que também invoco merecidamente o meu irmão.
Vítor Ramalho
(Secretário-geral da UCCLA)