UCCLA lança número especial da revista Mensagem
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UCCLA lança número especial da revista Mensagem
Portugal | Lisboa
Publicado em 31-10-2015
O Salão Nobre dos Paços do Concelho foi palco, dia 29 de outubro, do lançamento do número especial da revista Mensagem, um Boletim associativo publicado pela Casa dos Estudantes do Império, em Lisboa, entre 1948 e 1964, e que assumia a expressão dos interesses, identidades, opções e projetos dos estudantes africanos.
 
Com este lançamento a UCCLA assinalou, também, o 30.º aniversário da sua criação. 
 
O evento contou com as intervenções do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, da Embaixadora Alda Melo - em representação do Secretário Executivo da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), Murade Murargy, do Secretário-Geral da UCCLA, Vitor Ramalho, e da jornalista Diana Andringa.
 
      

Este evento inseriu-se na homenagem que tem vindo a ser feita pela UCCLA aos associados da Casa dos Estudantes do Império, desde outubro de 2014.
 
A abrir a sessão, Vítor Ramalho relembrou que a UCCLA foi “a primeira instituição criada para responder às questões de afetividade e dos interesses que existem entre os povos que falam e se exprimem em português. Foi criada, exatamente, a partir desta casa, há 30 anos, pelo Eng.º Kruz Abecasis e tem tido um papel que ultrapassa, de longe, aquilo que foi a visão inicial. Neste momento inclui 40 cidades de língua oficial portuguesa, de todos os países que falam português e obviamente desde logo as capitais, mas também 40 empresas de vários países, de grandes e pequenas dimensões, que procuram apoiar a dinamização que a UCCLA tem em vários domínios”, dando exemplos de alguns projetos e trabalhos desenvolvidos pela UCCLA, ao longo dos anos, em diversos países.
 
“Ao assinalar os 30 anos da criação da UCCLA, promovemos uma homenagem aos jovens que, nos idos de 60, quando não havia universidades nas ex-colónias portuguesas, vinham para cá estudar, e esses jovens acabaram por ser percursores e figuras incontornáveis da literatura dos países de expressão portuguesa, particularmente africanos. Eles reuniam-se numa instituição que foi criada pelo regime anterior, a Casa dos Estudantes do Império (CEI)”. 
 
      

Para Vitor Ramalho, a CEI desempenhou um papel fundamental nos movimentos de libertação das ex-colónias e contribuiu para a formação de tantos jovens, citando algumas das personalidades que viviam na casa. 
 
“A Casa dos Estudantes do Império tinha um boletim que se chamava “Mensagem” e que, há 21 anos trás, um conjunto de ex-associados da instituição levou a efeito a publicação desta Mensagem… que tem o contributo de vários historiadores que fazem o balanço histórico do que foi a CEI, o papel que estes jovens tiveram, testemunhos de memórias de associados, alguns deles infelizmente já falecidos, mas também vários fragmentos e documentos fotográficos e outros tipos de documentos que refletem a preocupação do regime, na altura, em função desta torrente de jovens que ansiava pela liberdade”. 
 
      
 
A Embaixadora Alda Melo realçou os 30 anos da UCCLA e enalteceu o “excelente trabalho que tem vindo a desenvolver, particularmente junto dos nossos países”.
 
Alda Melo lembrou a criação da CEI e destacou o “papel determinante no diálogo multicultural, no aprofundamento do conhecimento mútuo e na partilha de ideais entre os estudantes oriundos dos territórios ultramarinos portugueses. O ambiente pluralista que se vivia na Casa dos Estudantes do Império contribuiu de forma determinante para a formação intelectual e política dos jovens, impulsionando-os a criar espaços de reflexão onde, para além de críticas ao sistema colonial, eram debatidos temas relativos à identidade africana e dos territórios de que eram oriundos”. 
 
“O encerramento da Casa dos Estudantes do Império, por ordem do regime na altura, não diminuiu o ímpeto revolucionário desses jovens estudantes, que decidiram juntar-se aos movimentos de libertação dos seus respetivos territórios, onde viriam a desenvolver ações decisivas nas lutas pela independência nacional. Decorridos 50 anos após a sua extinção recordamos que a CEI foi um verdadeiro viveiro de líderes africanos, tendo desempenhado um papel fundamental no processo de libertação das colónias portuguesas”, referiu a Embaixadora.
 
De acordo com Alda Melo, com este lançamento especial da revista Mensagem “queremos prestar a merecida homenagem à iniciava de homens e mulheres que, meditando sobre os conceitos de liberdade, justiça, política e cultura defenderam os ideais que enformam as nossas sociedades” em conjunto com os “princípios fundamentais democráticos do respeito pelo outro e de valorização da liberdade intelectual, cultural e social. Com este gesto, de elevado simbolismo, pretendemos manifestar o nosso reconhecimento pelo assinalável contributo da Casa dos Estudantes do Império para a emancipação dos nossos povos e países, contributo que foi marcante desde a sua criação e ao longo da sua existência”, concluindo que “a CEI e as ações ali desenvolvidas pelos nossos estudantes constituem uma referência na nossa memória coletiva, sobretudo no atual momento histórico que vivemos, num mundo em mudança em que estamos colocados perante desafios que nos interpelam, a todos, no sentido de unirmos os nossos esforços para garantir o desenvolvimento económico e social dos nossos países, a felicidade e o bem-estar dos nossos povos”.
 
“Eu não cheguei a frequentar a Casa e só, muitos anos mais tarde, já como jornalista, é que vim a conhecer algumas daquelas personalidades que passaram na Casa dos Estudantes do Império e que marcaram senão a história de África e, nalguns deles, de toda a África, mas pelo menos a dos países africanos de língua oficial portuguesa”, referiu Diana Andringa na sua intervenção. 
 
“Não cheguei a frequentá-la mas tenho da Casa, para lá de uma memória literária, uma memória “em segunda mão”, feita daquelas que, ao longo do tempo, fui recolhendo das pessoas que a frequentaram”. Recordou as suas primeiras memórias, em finais de 68, quando decidiu escrever um artigo sobre a guerra em Angola, para a revista Vida Mundial, onde a busca de fontes e de informações a levaram, inevitavelmente, a conhecer antigos frequentadores da CEI. Rapidamente passou a frequentar os locais de encontro destes antigos frequentadores da Casa, como o Café Nova Iorque e, mais tarde, o Café Rialva (frente à sede da Casa) e a sua habitação passou a ser “uma sucursal, bem mais pequena, da Casa dos Estudantes”, confessou.
 
Para Diana Andringa a Casa “era o Império ao contrário ou, talvez melhor, o cadinho de um anti Império que uniria todos numa luta comum pela libertação”. Num testemunho pessoal, com o relato da prisão e das múltiplas lutas travadas, afirmou que “não é porque falamos todos português e não é porque houve um império, é porque combatemos juntos o império, o colonialismo e o fascismo e isso sim é que fez a unidade entre nós e faz com que eu sinta as pessoas que nesses países passaram pela Casa dos Estudantes do Império ou que pertenceram de uma forma ou de outra, mesmo por herança, à Geração da Utopia, os sinta como meus irmãos, como meus patrícios, como pessoas da mesma Pátria”, confessando que esta é “a herança da Casa dos Estudantes do Império e dos seus ativistas, dos autores da Mensagem que hoje aqui homenageamos. É essa memória que eu me sinto obrigada a defender, mantendo-a, divulgando-a, o mais que possa e sei, e que me sinto obrigada a agradecer-lhes porque eles souberam uma coisa muito difícil…. trocaram o império da humilhação pela tal diáspora da amizade”.
 
Diana Andringa manifestando “esse estado de espírito, pelo humor, pelas canções, pela coragem, por esse sim gritado tão alto num país que nos queria calados e de olhos postos no chão” conclui dizendo “Obrigada malta da Casa dos Estudantes do Império, não cresçam faz favor, mantenham-se a Geração da Utopia!”. 
 
O presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, felicitou a UCCLA pelos seus 30 anos «de construção e de criação de uma realidade muito forte, fruto do trabalho de muitos».
 
Fernando Medina recordando a sua infância, no Porto (Portugal), confidenciou que o seu pai abrigou Óscar Monteiro (em fuga do país), um dos associados da delegação da CEI em Coimbra, e relatou a história de uma mesa de madeira preta existente na casa – “nós gostávamos de brincar a correr à volta da mesa mas éramos constantemente repreendidos, diziam-nos para termos cuidado para não estragar a mesa que tinha sido uma oferta de um amigo. Durante anos essa mesa apenas significou de estorvo para mim, afinal impedia-me de brincar”, que viria a saber anos mais tarde que era uma oferta como prova de gratidão.
 
O autarca adiantou que a “CEI representa não apenas a memória, mas uma visão de futuro” e ressaltou que “a preservação da memória é dos legados mais importantes para a construção e manutenção de uma sociedade livre, aberta, democrática e cosmopolita da qual Lisboa tem de ser orgulhosamente uma bandeira”.
 
      
 
Esta sessão contou com diversas presenças, como do antigo Presidente da Assembleia da República de Portugal, António de Almeida Santos, Embaixador de Angola junto da CPLP, Luís José de Almeida, presidente do Camões - Instituto da Cooperação e da Língua, Ana Paula Laborinho, vereadores Carlos Manuel Castro, António Proa e Carlos Moura, antigos associados da CEI, representantes diplomáticos, diversas personalidades ligadas à CEI e associações lusófonas.
 
 
A maioria das fotografias foram cedidas pela Câmara Municipal de Lisboa, Manuel Levita